A 16ª Rodada de Licitações de Blocos Exploratórios da Agência Nacional do Petróleo (ANP) terminou, nesta quinta-feira, 10, sem ofertas para 24 do total de 36 blocos oferecidos no leilão. Entre as áreas de alta sensibilidade ecológica, que causaram insegurança nas empresas petroleiras, estão os quatro blocos da bacia de Camamu-Almada, localizados na região do Parque Nacional Marinhos dos Abrolhos – área com a mais rica biodiversidade do Atlântico Sul.
Há meses, protestos em defesa de Abrolhos começaram a chamar atenção para o risco de uma tragédia ambiental irreversível caso os blocos próximos ao parque fossem leiloados, explorados e contaminados após algum incidente com derramamento de óleo. Uma das ações que intensificaram as pressões contra o leilão foi a campanha liderada pela ativista Tamires Felipe Alcântara e apoiada pela Conexão Abrolhos, que reuniu 1,1 milhão de assinaturas.
O abaixo-assinado criado por Tamires na plataforma Change.org ganhou um ato simbólico de entrega nesta quarta-feira (10), um dia antes da rodada de licitações. O total de 1,1 milhão de assinaturas coletadas foi levado para o Congresso Nacional e ao Ministério Público Federal (MPF), aumentando ainda mais a pressão sobre o certame. A entrega foi feita pela ativista e por representantes da Conexão Abrolhos, integrada por Conservação Internacional, Oceana, Rare, SOS Mata Atlântica, WWF-Brasil e pelo grupo Liga das Mulheres pelos Oceanos.
“A entrega do abaixo-assinado aos parlamentares foi ótima! Todos foram muito receptivos e aproveitaram o espaço para também defender Abrolhos e se posicionar contra o leilão”, comenta a ativista sobre o recebimento da petição por parte de sete parlamentares, entre eles os deputados Nilto Tatto (PT-SP), coordenador da Frente Parlamentar Ambientalista, Rodrigo Agostinho (PSB-SP), presidente da Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (CMADS) da Câmara, Alessandro Molon (PSB-RJ), líder da oposição na Casa, e o senador Fabiano Contarato (Rede-ES), presidente da Comissão de Meio Ambiente do Senado.
“Se houver acidente envolvendo petróleo, a biodiversidade, os povos tradicionais e as pessoas que vivem do turismo na região serão afetados de forma cruel”, declarou Tamires durante o ato de entrega. “Defender a natureza é lutar pelos seres que não têm voz, pelas populações mais vulneráveis e é também lutar pela nossa sobrevivência e das futuras gerações”, completou.
Além de entregar as assinaturas aos parlamentares, o grupo levou a petição até a 4ª Câmara do Meio Ambiente e Patrimônio Cultural do MPF, onde ela foi acolhida pelos procuradores Nicolao Dino de Castro e Costa Neto e Daniel Cesar Azeredo Avelino. Nenhum pouco receptivo, entretanto, foi o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, que participava de audiência pública na Câmara dos Deputados e se recusou a receber o abaixo-assinado das mãos dos ativistas. Após muita insistência, um de seus assessores acabou pegando a petição.
Tamires lamentou que o ministro do Meio Ambiente não esteja aberto à ação pacífica e cordial de diálogo com os ativistas. O diretor da Change.org Brasil, Rafael Sampaio, que esteve com a jovem durante o ato de entrega da petição, destaca que “é muito saudável e importante para a democracia que a sociedade seja ouvida”. Segundo Sampaio, a mobilização da sociedade faz a diferença para a mudança social. “Se as pessoas não se mobilizarem, não só no mundo online, mas no mundo offline, na vida real, e não forem para a Câmara, para a casa do povo, para as ruas, e pedirem mudanças, essas coisas não vão acontecer”, comentou.
Fim do leilão e o futuro dos blocos de petróleo
A 16ª Rodada de Licitações da Agência Nacional do Petróleo terminou com ofertas de 10 empresas vencedoras para 12 blocos. Com o certame, o governo arrecadou R$ 8,9 bilhões. De acordo com o ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, e o diretor-geral da ANP, Décio Oddone, que deram entrevista coletiva à imprensa após a realização do leilão, os blocos não arrematados entrarão no sistema de ofertas permanentes da ANP. Por isso, ativistas e ambientalistas reconhecem a vitória de uma batalha, mas entendem que a luta continua.
“A boa notícia é que os blocos próximos ao Parque Marinho dos Abrolhos não recebeu oferta durante a licitação. A má notícia é que esses blocos serão incluídos em um sistema de ofertas permanentes da ANP”, resumiu Tamires. “Seguiremos defendendo Abrolhos e o meio ambiente”, completou a autora do abaixo-assinado enfatizando que “não podemos desistir”.
Além da forte pressão ambiental, outra razão que reduziu a atratividade das áreas da bacia de Camamu-Almada para as empresas foi o imbróglio judicial no qual elas estão envolvidas – a Justiça Federal e o Ministério Público Federal mantêm os blocos sob questionamento. Neste caso, companhias que comprarem os blocos podem não conseguir licença ambiental para explorá-los. Situações semelhantes já ocorreram após leilões de petróleo realizados no Brasil.
“Nós estamos avisando antes que aconteça mais um crime ambiental”
Em Abrolhos existem mais de 1.300 espécies marinhas, sendo 45 consideradas ameaçadas, além de uma grande área de recifes costeiros, manguezais e arquipélagos. A região é, ainda, berçário das baleias jubarte, bem como morada de tartarugas-marinhas ameaçadas de extinção. A riqueza natural do parque também estimula fortemente o turismo local.
A defesa da “Amazônia dos oceanos”, como Abrolhos é conhecido, foi abraçada por calorosos discursos durante a entrega das assinaturas da petição no Congresso. Os parlamentares que a receberam enfatizaram a importância ambiental do parque marinho e lançaram alertas sobre os riscos de entregá-lo à exploração petrolífera. “Nós estamos avisando aqui, antes que aconteça, está se preparando mais um crime ambiental no Brasil. Está se preparando mais uma destruição que depois será lamentada, chorada”, falou o deputado Alessandro Molon.
Já o senador Fabiano Contarato, que junto com o também senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) moveu uma ação na Justiça Federal para impedir o leilão da ANP, convocou todos a “fazerem a sua parte”, a exemplo da ativista que criou a mobilização. “Nós temos que estar vigilantes, o Congresso tem que fazer a sua parte, a Câmara dos Deputados e o Senado Federal também, e a sociedade civil através de comportamentos como o da Tamires. Isso sim é o que nos dá força e nos motiva a tentar construir uma sociedade mais justa”, desabafou.
Representando a Conexão Abrolhos, Camila Valadares, da ONG Oceana, também destacou a proporção a que chegou a campanha lançada em abril por Tamires. “O governo tem que abrir os olhos e enxergar que mais de 1 milhão de pessoas estão engajadas”, disse.
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Sob pressão, leilão de petróleo acaba sem ofertas para Abrolhos publicado primeiro em https://catracalivre.com.br
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