No palco, um mosaico cênico com histórias, memórias, como se fossem caixinhas de lembranças. Por meio de dispositivos – a princípio simples – como escutar histórias na feira, observar um velário, conversar com pessoas e ir a uma igreja, o Grupo Sobrevento recolheu diversos depoimentos para criar seu mais novo espetáculo, Noite, que estreia em 1º de fevereiro de 2019 no Espaço Sobrevento, às 20h30, com entrada franca. O projeto foi contemplado pera 31ª edição do Programa Municipal de Fomento ao Teatro para a Cidade de São Paulo e tem entrada gratuita.
Criado a partir do Teatro de Objetos – linguagem que o grupo pesquisa profundamente desde 2010 – o espetáculo tem uma dramaturgia que nasceu dos depoimentos de seus vizinhos e das suas histórias, todas relacionadas a objetos guardados, secretos, carregados de afetos, ou ainda do sentimento pela ausência/perda deles.
Sandra Vargas, que divide a direção da peça com Luiz André Cherubini, conta que Noite foi concebido a partir da prática da escuta dos moradores locais e não de um tema pré-determinado pelo grupo. Entender como a população lida com as próprias memórias e quais histórias elegem para contar ao outro foi determinante para que a dramaturgia, criada em conjunto pela companhia, tomasse forma.
Em cena, um homem cego interpretado por Luiz André Cherubini conversa com um menino e sua fala é atravessada por suas memórias. O cenário composto por 11 nichos de tamanhos variados, sobrepostos, torna possível contemplar na cena todas as personagens que compõem a memória desse homem. A princípio, a luz ilumina cada figura por vez, dando vida a uma determinada memória, mas como num processo típico do pensamento humano, há momentos em que as memórias se misturam, se interrompem ou aparecem de forma fragmentada. Cada ator representa a potência máxima dessa memória, carregando em seu nicho elementos visuais que remetem ao pensamento do homem cego.
“As pessoas pensam que a vida é um longo caminho para frente, mas ela não é mais do que um passeio pela vizinhança”, diz o protagonista em determinado momento da peça. Durante o processo de criação, depoimentos pessoais de vizinhos, histórias do bairro e dos arredores do Sobrevento reuniram-se para contar as lembranças de alguém que “já não vendo mais a luz que há, se apega a luz que havia”. Na narrativa se misturam memórias de esperança e alegria, fantasmas que perseguem na escuridão e evocam o medo da morte, da dor das perdas, da fragilidade humana e das saudades.
O desafio do grupo foi amarrar as histórias colhidas e ressaltar na cena como determinado objeto conduz a narrativa. Um vestido, uma vela, uma tesoura e pratos de cozinha são alguns dos objetos que disparam as memórias. “Foi importante preservar a simplicidade com que cada pessoa nos contou sua história”, destaca Sandra. A artista ressalta que os assuntos mais recorrentes durante as conversas eram os relacionados com terra, morte e jardim.
Os figurinos assinados pelo estilista e figurinista João Pimenta, remetem a temas religiosos. Coroas de flores, túnicas, vestidos brancos, asas e penas compõem a vestimenta das personagens. O Grupo Sobrevento está indicado ao Prêmio Shell de Teatro de 2018, na Categoria Inovação, pela sua pesquisa no Teatro de Animação e de Objetos.
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Peça conta histórias de moradores do Brás e do Belenzinho publicado primeiro em https://catracalivre.com.br
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